Segundo a médica, as tentativas de suicĂdio de colegas representam um desafio na profissão.
De acordo com Grasiela, desde 2017, percebe-se uma preocupação com os desfechos relacionados com a saĂșde mental. A partir daquele ano, veĂculos nacionais e internacionais voltados para o tema passaram a se preocupar com as possibilidades de suicĂdio.
Um dos casos relatados foi o de uma estudante de medicina de universidade norte-americana que, jĂĄ na fase final do curso, acabou se matando, ao jogar-se do alojamento. "Foi uma comoção e levantou a questão relevante de que o suicĂdio acontece e, muitas vezes, acontece mais próximo do que se imagina."
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Um dos casos relatados foi o de uma estudante de medicina de universidade norte-americana que, jĂĄ na fase final do curso, acabou se matando, ao jogar-se do alojamento. "Foi uma comoção e levantou a questão relevante de que o suicĂdio acontece e, muitas vezes, acontece mais próximo do que se imagina."
Pré-pandemia
Pesquisa realizada antes da pandemia com 130 mil estudantes de 47 paĂses revelou prevalĂȘncia de 11% de manifestações psĂquicas nessa população, e 15,7% buscaram atendimento psiquiĂĄtrico. Foi encontrada prevalĂȘncia de sintomas depressivos de quase 30%. "A procura por auxĂlio não é feita pela maioria dos estudantes, e isso vale para os médicos também", destacou Grasiela.
Também no Brasil, desde 2017, a Universidade de São Paulo (USP) registrou seis tentativas de suicĂdio entre estudantes de medicina, tendĂȘncia que acabou sendo verificada em outras universidades. Um estudo feito na época encontrou prevalĂȘncia de depressão de 30% entre os estudantes de medicina, prevalĂȘncia de ansiedade de quase 33%, baixa qualidade de sono e sonolĂȘncia matinal que atingiam quase metade dos alunos, cada.
Em 2019, em tese de mestrado, Grasiela tentou entender quais eram os estudantes de medicina com tendĂȘncia suicida e encontrou prevalĂȘncia de quase 9% em uma amostra de cerca de 5 mil estudantes que jĂĄ tinham tentado suicĂdio. Entre os fatores de risco nessa população, aparecem homossexualidade, bissexualidade, baixa renda baixa, traumas na infância ou na fase adulta, bullying na universidade, história familiar de tentativa de suicĂdio ou de suicĂdio consumado, uso diĂĄrio de tabaco e consumo excessivo de ĂĄlcool.
Existem ainda fatores de vulnerabilidade. Entre as dificuldades encontradas estão idade precoce, dependĂȘncia financeira da famĂlia, a própria saĂda da casa dos pais, distância da famĂlia, solidão, diferenças culturais, maior exposição a fatores estressantes, como as demandas acadĂȘmicas. Grasiela destacou que 90% dos pacientes que tentam suicĂdio tĂȘm comorbidades psiquiĂĄtricas não tratadas ou tratadas de forma incorreta.
Covid-19
No inĂcio da pandemia de covid-19, o isolamento social gerou impacto na saĂșde mental da população em geral e, também, dos estudantes de medicina. O fato foi agravado pelo próprio adoecimento, pela doença de familiares e morte de parentes e amigos. O ponto positivo foi no aprendizado. Do grupo de 41 estudantes que participaram da experiĂȘncia, 37,9% mostraram prevalĂȘncia de depressão e 33,7% de ansiedade. De acordo com a Organização Mundial da SaĂșde (OMS), 25% dos sintomas depressivos e de ansiedade aumentaram durante a pandemia e no perĂodo pós pandemia.
Estudo feito no Brasil apurou que 62% da massa de estudantes de medicina estavam em procedimento psĂquico, 55% acabaram relatando perda de interesse, quase 40% sentiram-se inĂșteis, quase 20% sentiram-se incapazes de desempenhar um papel Ăștil na vida e 9% demonstraram tendĂȘncia suicida.
Na população médica, pesquisa efetuada na fase pré-pandemia, na China, em 2020, publicada na revista Lancet, revelou que 46% dos médicos tiveram sintomas de depressão grave; 41%, sinais de ansiedade e 70%, sintomas moderados a graves. Para prevenir o suicĂdio tanto entre estudantes de medicina e profissionais mais velhos, a psiquiatra disse que é preciso identificar precocemente os sintomas e oferecer assistĂȘncia em relação a isso. Um dos fatores que mexem com os profissionais é a aposentadoria futura, disse Grasiela.
Entre as motivações encontradas em 200 médicos que se suicidaram nos Estados Unidos, durante a pandemia, a médica citou a incapacidade de trabalhar ante a deterioração da saĂșde, o uso de substâncias quĂmicas, conflitos de relacionamento, estresse financeiro, questões trabalhistas e institucionais.
*A repórter viajou a convite da Associação Brasileira de Psiquiatria
AgĂȘncia Brasil