As sirenes que o filho Uriel, de 2 anos, acreditava ser de ambulância eram, na verdade, estridentes alarmes para alertar sobre o disparo de foguetes feitos pelo grupo extremista Hamas.
Nathália atravessou neste sábado o portal de desembarque do aeroporto, empurrando um carrinho cheio de malas e os dois filhos israelenses, Uriel e Benjamim, de 5 anos. Depois de quase sete anos vivendo em Jerusalém, ela entendeu que era hora de pedir ajuda ao governo brasileiro e voltar para o Rio de Janeiro, onde mora a família dela."Foram dias intensos e tensos. A situação realmente está muito tensa, e eu não queria correr nenhum tipo de risco com meus filhos, sou sozinha com duas crianças pequenas, então eu quis sair para poder vir para o Brasil", explica.
Corrida para bunker
Na última semana, por várias vezes ela teve que levar os filhos para um bunker. Algo fora da realidade de um brasileiro, bunker é uma espécie de abrigo, um quarto de segurança presente em muitos prédios e residências israelenses.
"Não tenho o quarto de segurança dentro de casa. Fica no subsolo do meu prédio, e o prédio não tem elevador. Então tinha que descer cinco andares de escada, toda vez que tinha sirene, com os dois [filhos], subir e descer toda hora. A gente teve muita [sirene] no sábado [passado]. Teve de novo na segunda. Esses dias teve uma vez também", relembra.
"Nunca tinha passado por nada do tipo. Já tinha passado em outros momentos pela questão de foguetes, mas nunca de uma forma que eu me sentisse correndo risco do jeito que eu me senti agora. Foi a primeira vez que eu não me senti segura em Israel", conta.
Os ataques aos quais Nathália se referem foram iniciados pelo Hamas no sábado passado (7), o que desencadeou respostas de Israel. Milhares de israelenses e palestinos morreram desde então.
Atitudes divididas
Ao mesmo tempo em que Nathália deixava Uriel acreditar que as sirenes eram simples ambulâncias; e bunker, um lugar de brincadeira, ela teve que explicar a Benjamim o que estava acontecendo.
"Ele já entende alguma coisa, então eu expliquei o que ele precisa saber para dar a devida importância para a situação e entender que na hora da sirene não é brincadeira [e tem que se proteger].
Com os pés no Brasil, a analista de dados diz que foi tomada por uma sensação de alívio, mas faz a ressalva de que só voltou por causa dos filhos.
"Alívio principalmente por eles. Se eu estivesse sozinha, talvez teria ficado até para apoiar mesmo o país, apoiar os soldados que estão indo lutar pela gente", afirma Nathália, que foi morar em Israel por escolha própria. "Eu sou judia, para mim faz muito sentido morar lá, tudo pela questão religiosa e cultural. Dá uma dor ter que sair", lamenta.
Família completa
A fotógrafa Luíza Santos chegou ao Brasil grávida. Além dela, o marido, um engenheiro israelense, também deixou Israel no voo da FAB. A Operação Voltando em Paz repatriou 701 brasileiros desde quarta-feira.
"Estou muito emocionada porque ver tudo isso que aconteceu nos últimos dias, eu fiquei com muito medo. Ter que voltar, vir para minha casa, deixar todas as nossas coisas lá, eu não sei como vai ficar. É tudo uma surpresa", diz em um momento de choro.
"A gente viu as atrocidades que aconteceram esta semana, então é tudo muito complicado, nós estamos muito nervosos", desabafa, antes de agradecer o governo brasileiro pela acolhida e transporte.
A operação organizada pelo Ministério das Relações Exteriores (MRE) e pela FAB trouxe também para território brasileiro oito animais de estimação. Dois deles são os cachorros que acompanhavam Luíza e o marido.
"Não tinha como eu vir com o meu marido e deixar meus cachorros lá. E se alguém invade a nossa casa?", pergunta a fotógrafa que tem família em Ribeirão Preto, no interior paulista, e estava havia nove anos em Israel.
Escolhas
A pesquisadora Priscila Grimberg deixou o aeroporto internacional do Rio com sensações distintas. Ao mesmo tempo em que estava aliviada por reencontrar a filha Maia, de 15 anos, que passou dois anos estudando em Israel, sentia uma lacuna ao entender que a outra filha, Miriam, de 23 anos, escolheu ficar em Israel. Há três anos, ela serve como combatente no exército israelense.
"Ela ficou, como a gente tem visto um movimento muito grande de vários judeus querendo defender o estado. Então ela quis ficar lá para isso", explica a mãe, que se sente dividida. "Um dilema humano entre olhar o particular e o coletivo. Como mãe, eu quero as minhas filhas aqui; como judia, eu quero uma combatente lá", diz.
Agência Brasil